Nas gargantas do rio Tarn, do lado esquerdo para quem vai rumo a Santa
Enimia, um curioso castelo expõe suas
ruínas fantasmais sobre um rochedo quase inacessível. O seu deplorável estado
liga-se à lembrança lendária de um nobre que não quis ir às Cruzadas e, caindo
numa extrema moleza, teve o coração corrompido pelas mulheres. Desde então um
animal estranho - dizem -volta de tempos em tempos ao local e solta misteriosos
gemidos.
Os remotos fatos aconteceram no século XIII. Nessa época, São Luís rei
da França, bispos, barões, senhores e servos partiam para as Cruzadas.
Foram procurar a Raymond, Senhor do castelo, para ir defender a Terra Santa. Porém, desde o alto de sua poderosa torre, ele berrou:
Foram procurar a Raymond, Senhor do castelo, para ir defender a Terra Santa. Porém, desde o alto de sua poderosa torre, ele berrou:
- Eu fico!
- Mas como, senhor? Todo o mundo vai para a Cruzada!
- A mim, o elmo me afoga, e o casco me esmaga
- Mas, senhor, nós ...
- Chega! Vão embora. Eu não
fui feito para carregar armas ou armaduras, mas antes bem para cantar poesias,
afirmou fortemente e se encerrou na fortaleza É verdade que Raymond parecia ser um bom
trovador e não um guerreiro.
O tempo passou.
Todos partiram para a Cruzada. A vergonha e o remorso começaram a tomar conta
de Raymond. A vergonha de se sentir inútil, de ficar só no seu castelo
como um urso na sua toca. Por fim, chegou a primavera, e com ela seu
coração sentimental e mole desbordava de melúrias.
Uma manhã, ele
desceu até a aldeia achando que, mesmo andando fora da estrada, a vida era
muito bela e valia a pena gozá-la. As camponesas, vendo que seu senhor se
aproximava, rodearam-no dizendo: “Ah, como nós estamos tristes, mulheres
e moças” .
- Mas, por que diabos? - interrogou
Raymond.
- É que nós ficamos sem nossos noivos, esposos, e pior... Sem os homens,
nossos dias são tediosos e nossas noites são muito longas.
- Pois bem, sim,
quer dizer, balbuciou Raymond. Mas, ouvindo essas lamentações seu coração
derreteu como a cera sob o sol.
- O Sr. é nosso
nobre, ajude-nos, acrescentaram as mulheres.
- Creio
conhecer o remédio para vossos males e eu vos consolarei todas se o Céu me
ajudar, respondeu Raymond.
Foi assim que o
castelo do senhor-trovador virou ponto de romaria para todas as mulheres
tristes ou sofrendo mal de amores.
Um dia, uma
velha mulher lhe disse: “Isso vai acabar mal. Abusando desse jeito, o animal
morre”. Raymond não prestou, ou fingiu não prestar, atenção. Cada mulher
da cidade tirou dele até a última gota do festim que ele lhes ofereceu.
Assim, o senhor
que com seus versos distribuía chamas de sentimentos, uma noite, como um fogo
que não é cuidado, morreu. e entregou a
própria alma... Mas, a quem?
O sacerdote da
cidade não quis benzer o corpo desse senhor pecador. E as cinzas desse fogo
extinto foram jogadas no fundo do túmulo, sem cerimônia religiosa. Não
se sabia se sua alma fora levada pelo diabo. Porém todas as mulheres do local acharam que, no dia seguinte, um estranho
animal cabeludo, chifrudo e cor de pele levantou voo por trás do rochedo do
castelo.
Algumas
garantiam ser um grande bode da montanha que soltava balidos infames olhando
para a aldeia. A velha senhora deu a palavra final dizendo:
- É a alma do
Senhor Raymond!
Desde aquele
triste dia pode se ouvir, por vezes, nas noites de lua cheia, no topo das
ruínas, um balido cheio de lamentos acompanhado de estranhos murmúrios de vozes
femininas. Os mais ousados
insistem que é algo como um bode que esvoaça em torno do castelo.
Por isso, o
local ficou chamado: Castelbouc, ou o castelo do bode.